O empreendedorismo já não é o que era
É a importância do empreendedorismo para a sociedade liberal que torna as declarações do Secretário de Estado do empreendedorismo – sim, um governo ostensivamente neoliberal tinha que ter um – relevantes para retratar os tempos que correm. “Temos que perceber que não cabe ao Estado criar emprego. Quem cria emprego são as empresas”. Aqui não há novidade, o empreendedorismo sempre foi uma das forma de desresponsabilizar o Estado pelas políticas de criação de emprego. Apenas tornou as condições claras. Porém, Carlos Oliveira foge ao tom tradicional e solicita “à juventude portuguesa que concentre energias em encontrar solução e não a lamentar-se que não há soluções para o país”. Se antes se exortavam as massas com o lugar no Olimpo, agora retrata-se uma sociedade à beira do abismo e safa-se quem arranjarar solução para não ser arrastado na queda coletiva. Se durante décadas, o horizonte por defeito era a morada dos deuses, hoje apresenta-se o calvário. Antes havia lugar para todos, bastava ter mérito, e o Estado mínimo zelava pelos indigentes residuais. Agora, só há lugar para quem se safe, os outros já se sabe caem no abismo. Esta é de facto uma ínfima alteração no discurso, de peito cheio para braços caídos, mas faz toda a diferença. Torna claro que já nem os neoliberais conseguem dizer que o neoliberalismo tem algo a oferecer à sociedade. Está instituída a meritocracia na sua verdadeira dimensão, a lei do mais forte protegido pelas leis do mercado. Não admira assim que nalgumas partes da Europa seja já própria democracia liberal que se tenha tornado o alvo dos executantes da política neoliberal. A fábrica de ilusões colapsou, a sobrevivência do regime já não se coaduna com liberdades, nem mesmo com representatividades. A História está à espera de ser escrita.
Etiquetas: neo-liberalismo
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