quarta-feira, janeiro 23, 2013

Gás de xisto? Não, obrigado

Publicado no esquerda.net


Um século de uso intensivo de energia fóssil colocou o planeta a um passo do abismo. Agora, existindo um consenso social sobre as alterações climáticas e sobre a necessidade de mudar de rumo, há quem queira apostar nos hidrocarbonetos não convencionais (petróleo offshore, areias betuminosas e gás de xisto), com efeitos sociais e ambientais ainda mais gravosos que os convencionais. Em Portugal existe já um contrato de prospeção para gás de xisto.

A produtividade destes poços diminui drasticamente ao fim de dois anos, o que leva a uma busca incessante do próximo poço. A aposta no gás de xisto é a manutenção de um modelo energético falhado mas em pior, para o planeta e para as pessoas. O Bloco lança o debate em Portugal e apresentou uma proposta para proibir a exploração e a extração de gás de xisto, salvo para fins científicos.

O gás de xisto é a nova panaceia do capital. Afinal os recursos não são finitos, pelo menos por ora, e a energia fóssil pode afinal ser barata. Já se sabe, os custos ambientais e sociais são repartidos pela sociedade para que os lucros fiquem nas mãos de poucos. A sustentabilidade do planeta não é obstáculo para quem apenas tem como meta a sua taxa de rentabilidade.


O que é o gás de xisto?

O gás de xisto é o gás natural que se encontra aprisionado no subsolo entre formações xistosas, em profundidades entre os 600 e os 3.000 metros. Os reservatórios prolongam-se por vários quilómetros de extensão pelo que à perfuração vertical se junta a perfuração horizontal e a fraturação hidráulica. Trata-se portanto de uma energia fóssil não renovável.


Quais os seus impactos?

O metano, o seu principal composto, tem 105 vezes mais potencial para aquecer a atmosfera que o dióxido de carbono nos primeiros 20 anos (após esse período perde rapidamente essa capacidade). Assim, a sua produção e as emissões evasivas associadas, geram 40 a 60 vezes mais emissões de estufa que o gás convencional. No curto prazo o seu efeito de estufa no planeta é superior ao do petróleo e ao do carvão.

O uso excessivo de água e a contaminação química, com metano e cancerígenos como o benzeno, de grandes massas subterrâneas e superficiais de água é um dos pontos centrais da exploração. Juntam-se a difícil gestão dos resíduos de perfuração, a poluição atmosférica, a destruição de paisagens e a perda de biodiversidade. Incrivelmente, a exploração de gás de xisto pode provocar terramotos como os que se verificaram em Inglaterra, onde a atividade esteve suspensa exatamente por esse motivo.

Os impactos sociais e ambientais são tão intensos que onde há exploração há organização popular de base na luta. Por esse motivo, nos Estados Unidos a indústria celebra, com os proprietários dos terrenos envolventes, acordos mútuos de não divulgação dos danos ambientais e sobre a saúde pública. Na União Europeia estes acordos não são possíveis, no entanto as normas comunitária sobre responsabilidade ambiental excluem esta indústria da obrigatoriedade de seguros adequados. Já vimos este filme na plataforma marítima Deepwater Horizon: lucro privado, risco público. Note-se que o advento desta nova energia só foi possível porque em 2005 George W. Bush a retirou do âmbito da Lei da Água Limpa.


Em Portugal e no mundo

Portugal está na rota da indústria. Existe já um acordo de prospeção de um poço de gás de xisto na zona de Aljubarrota. A cerimónia de assinatura do acordo entre a GALP e a Mohave Oil & Gas foi presidida pelo Ministro Álvaro Santos Pereira. Também já vimos este filme: recursos públicos, lucros privados.

As maiores reservas europeia situam-se na Polónia e em França. Neste último caso, primeiro Sarkozy e agora Hollande, proibiram a exploração. É ainda proibida na Bulgária, no Estado da Renânia do Norte-Vestefália na Alemanha, nos cantões de Friburgo e Vaud na Suíça. Nos EUA está interdita nos Estados Carolina do Norte, Nova Iorque, Nova Jérsia e Vermont e ainda em 100 governos locais. Junta-se o Quebeque no Canadá e a Nova Gales do Sul na Austrália. A Alemanha, a República Checa e a Roménia estão atualmente a ponderar a aplicação de uma moratória.


O gás de xisto na cultura popular

Em 2010, a famosa série televisiva CSI emitiu um episódio onde a equipa investiga várias mortes em resultado da contaminação da água por uma exploração de gás de xisto. No final o pequeno criminoso é apanhado, mas o suposto mandante escapa porque
 é peixe demasiado graúdo. Hollywood lançou Promise Land que deverá chegar à Europa em Fevereiro.

Trata-se de um filme sobre um empregado de uma empresa de gás de xisto que tenta comprar terras para a exploração e sobre a oposição da comunidade.

Estes argumentos no mainstream refletem a realidade profunda dos EUA, onde a indústria está verdadeiramente desenvolvida. Onde há exploração de gás de xisto o tema é absolutamente central na vida das comunidades. Ninguém fica ileso ou indiferente.