Eleftherotypia, o jornal dos trabalhadores
Etiquetas: Grécia, jornalismo, liberdade de expressão, trabalho
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O Sindicato da Habitação Social e a Organização para as Políticas Sociais dos Trabalhadores foram fundados em 1931 pelo Ministério do Trabalho grego. Sobreviveram a várias ditaduras mas a troika propõe-se a acabar com eles no seu segundo plano de "resgate". Em risco estão milhares de postos de trabalho, um amplo e abrangente serviço social que ambas prestam e um impacto negativo na economia. Curiosamente, apesar da sua natureza pública, na prática trata-se de mutualidades financiadas colectivamente pelos trabalhadores e nunca receberam um euro (ou um dracma) do orçamento de Estado. Que motivos levam então a troika a querer acabar com estas instituições?
O Sindicato da Habitação Social
Fundada após a guerra, que deixou dois milhões de refugiados, a instituição tem como missão garantir o direito à habitação. Apoia 120 mil famílias no pagamento da renda e 83 mil no pagamento do empréstimo. O seu financiamento decorre do desconto de 1% no salário pelos trabalhadores e 0,75% pelos empregadores. Os beneficiários são, na sua maioria, desempregados, precários, doentes e outras pessoas em situação económica desfavorável. Uma família que, com o apoio, paga agora 200 euros de renda, passará a pagar 400. Um empréstimo com uma mensalidade de 600 euros passará a ter o custo de 900. Este drástico aumento, combinado com uma taxa de desemprego galopante e cortes brutais nos salários, ameaça vários milhares de pessoas de despejo. A banca, ávida, já diz que quer alterar a forma como as pessoas pagam a casa.
É o Estado que recolhe a colectivização daquela parte do salário e, como tem uma enorme dívida à segurança social, esta está em dívida para com a organização: 2300 milhões de euros. Ainda assim, a instituição dispõe de 700 milhões de euros em depósitos e 15 mil milhões em património. Portanto, mais que um favor ao patronato (0,75% do salário não é um valor significativo), a extinção desta organização parece assumir os contornos da tentativa de roubo retroactivo de 18 mil milhões de euros nos salários dos trabalhadores gregos.
A Organização para as Políticas Sociais dos Trabalhadores
Esta organização é responsável pelo apoio social aos trabalhadores e pensionistas em várias áreas, garantindo-lhes ainda uma ampla oferta cultural e turismo social. Dispõe de 20 mil infantários no país, onde educação e alimentação são gratuitas. É responsável por 4,5 milhões de dormidas/ano em turismo social e organiza 150 produções teatrais, para além de garantir bilhetes gratuitos para diversos espectáculos. O seu esquema de financiamento é igualmente através da mutualização dos salários, mas é fácil de ver que o seu fecho coloca em risco milhares de pequenas e médias empresas. A resistência está em marcha. Para além das manifestações, greves e divulgação, um infantário foi já ocupado pelos seus 15 trabalhadores e está em autogestão.
A austeridade não ataca só na economia
A extinção destas duas instituição é não só violenta para os trabalhadores, pensionistas e desempregados, como também é ruinosa para a economia. O que leva então esta medida a figurar no segundo plano de "resgate"? Para além do assalto imediato aos descontos dos trabalhadores há mais razões. Já no memorando original se procurava destruir todas as organizações representantes dos trabalhadores. As alterações das leis laborais foram no mesmo sentido, de enfraquecimento – e quase abolição – da contratação colectiva e agora até da proibição de novos contratos permanentes no sector público. Estas mútuas tinham sobrevivido. Este é assim mais um passo nessa caminhada de anular todo e qualquer laço social entre os trabalhadores, toda e qualquer forma de solidariedade. A "austeridade" não se limita a ser o mecanismo de extorsão dos trabalhadores para o capital, é também uma forma de profunda engenharia social.
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Contudo, todo este discurso e todas estas medidas contrastam com a prática das instituições europeias. Nos próximos dez anos, 60% dos empregados das instituições europeias vão-se reformar, pelo que o recrutamento tem-se intensificado assim como a sua divulgação. Não é portanto raro ver notícias sobre o assunto, recheadas com declarações dos responsáveis pela área. Esta semana podemos ler na imprensa nacional que “a União Europeia quer recrutar mais e melhor”, que “há uma guerra pelo talento” e que “nós precisamos dos melhores para ajudar a fazer as políticas da União”. Portanto, como se propõe a União a conseguir atrair os melhores? Garantindo “um emprego para a vida” e “bem remunerado”. Ora, a política de recrutamento da UE está bem direcionada. Sabe que, para conseguir trabalhadores competentes e garantir um trabalho de qualidade, precisa de assegurar a permanência dos postos de trabalho.
É a própria política interna da União, definida pelos mesmos líderes que proclamam a ideologia da flexibilidade, que demonstra o quão erradas são as medidas que impõem aos povos da Europa. Infelizmente, por ora, a União procura trabalhadores competentes para aplicar políticas incompetentes no serviço à população. Por enquanto, a União é competente a impor o pagamento da crise aos trabalhadores, desempregados e pensionistas da Europa. Mas também isto muda, basta ter a força para aplicar as políticas competentes que ajustem a economia às necessidades das pessoas.
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É a importância do empreendedorismo para a sociedade liberal que torna as declarações do Secretário de Estado do empreendedorismo – sim, um governo ostensivamente neoliberal tinha que ter um – relevantes para retratar os tempos que correm. “Temos que perceber que não cabe ao Estado criar emprego. Quem cria emprego são as empresas”. Aqui não há novidade, o empreendedorismo sempre foi uma das forma de desresponsabilizar o Estado pelas políticas de criação de emprego. Apenas tornou as condições claras. Porém, Carlos Oliveira foge ao tom tradicional e solicita “à juventude portuguesa que concentre energias em encontrar solução e não a lamentar-se que não há soluções para o país”. Se antes se exortavam as massas com o lugar no Olimpo, agora retrata-se uma sociedade à beira do abismo e safa-se quem arranjarar solução para não ser arrastado na queda coletiva. Se durante décadas, o horizonte por defeito era a morada dos deuses, hoje apresenta-se o calvário. Antes havia lugar para todos, bastava ter mérito, e o Estado mínimo zelava pelos indigentes residuais. Agora, só há lugar para quem se safe, os outros já se sabe caem no abismo. Esta é de facto uma ínfima alteração no discurso, de peito cheio para braços caídos, mas faz toda a diferença. Torna claro que já nem os neoliberais conseguem dizer que o neoliberalismo tem algo a oferecer à sociedade. Está instituída a meritocracia na sua verdadeira dimensão, a lei do mais forte protegido pelas leis do mercado. Não admira assim que nalgumas partes da Europa seja já própria democracia liberal que se tenha tornado o alvo dos executantes da política neoliberal. A fábrica de ilusões colapsou, a sobrevivência do regime já não se coaduna com liberdades, nem mesmo com representatividades. A História está à espera de ser escrita.
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