Em 1981, logo no seu primeiro ano de presidente, Reagan viu-se perante uma greve dos controladores aéreos. Os sindicatos de trabalhadores do Estado estavam proibidos de recorrer à greve, pelo que a mesma era ilegal. Ronald Reagan foi decidido e deu um ultimato de 48 horas para os controladores voltarem ao serviço, caso contrário seriam despedidos. Os trabalhadores resistiram e dois dias depois, 11.345 dos quase 13 mil seriam despedidos. Reagan, que tinha classificado a greve como um perigo à segurança nacional, não hesitou em colocar em perigo a segurança aérea do país durante a década seguinte.
Entre 1984 e 85, foi a vez de Margaret Thatcher enfrentar uma greve do sindicato dos mineiros, um dos mais poderosos do Reino Unido. Perante uma greve de um ano, a dama de ferro não vacilou, conseguiu o apoio de quase toda a imprensa do país, e derrotou a greve e as reivindicações dos trabalhadores.
Nestes dois acontecimentos, o objectivo central não era derrotar aquelas lutas particulares. O objectivo era bastante mais amplo e estrutural: alterar o balanço de forças na sociedade, reduzir irremediavelmente a força do movimento operário e ganhar a hegemonia ideológica. O essencial era provar que os trabalhadores unidos podiam ser derrotados. Thatcher e Reagen abriram em força e à força o caminho para o neoliberalismo.
Na última semana, em Espanha, ocorreu uma ausência massiva e ilegal ao trabalho por parte dos controladores aéreos. A sua situação e contexto é bastante diferente dos seus congéneres norte-americanos ou dos mineiros britânicos. Mas este é certamente o ponto menos interessante da história, permitindo apenas colocar a nu algumas contradições evidentes.
Zapatero acusou imediatamente os trabalhadores de ganharem demasiado, muito mais que os seus comparsas europeus. Curiosamente, o governo espanhol – que assumiu a presidência do Conselho Europeu no primeiro semestre deste ano – nunca se mostrou sensível a harmonizar os salários e pensões na Europa. Curiosamente, durante todos estes anos, em que os controladores ganharam de forma “principesca” nunca o governo tomou qualquer medida. Agora, que pretendem privatizar a gestão aeroportuária espanhola baixam drasticamente o salário dos controladores por regulamentação governamental. O horário de trabalho é ainda aumentado, o pagamento de horas extraordinárias cortado assim como a admissão de faltas em caso de morte de familiares, entre outras medidas aplicadas. No mínimo, esta sequência mostra bem que na privatização de serviços públicos os governos se comportam como mordomos dos interesses privados. Pelo mesmo lado, os pensadores neoliberais que nos habituaram a pensar que o Estado não devia interferir nos salários e que o seu valor devia ser tanto maior quanto maior a responsabilidade exercida, ensinam-nos agora que já não é conveniente levar esses mitos ideológicos a sério.
Mas é a resposta do governo espanhol que fica para a História. Pela primeira vez desde o franquismo, o governo activou o estado de alerta, aplicando legislação militar a trabalhadores civis, obrigando-os a retomarem os postos de trabalho sob ameaça de 8 a 12 anos de prisão. Pelo meio, os aeroportos civis foram ainda ocupados e geridos pelos militares. Perante um conflito laboral, Zapatero não hesitou em o resolver com meios militares. Em plena crise social, com Espanha na lista negra do FMI e dos “mercados”, com o desemprego a ultrapassar os 20% e com o intensificar das medidas de austeridade – que como de costume incidirão preferencialmente sobre os mais pobres –, a resposta de Zapatero é um aviso para as lutas e conflitos sociais vindouros.
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