O beija-mão
Publicado no esquerda.net
Depois do governo PS chegou a vez de PSD e CDS irem ao beija-mão à troika FMI/BCE/CE. Uma encenação mediática que serve na perfeição os interesses dos partidos do arco da austeridade. Em plena campanha eleitoral a trindade PS/PSD/CDS vivia o drama de concordar no essencial das condições impostas e a tragédia de ter que “negociar” e se entender junta e publicamente sobre essas condições. De imediato, Teixeira dos Santos rejeitou este cenário e insistiu que cabia à Comissão Europeia negociar com a oposição portuguesa. Se a Comissão retorquiu que essa era tarefa do governo, a encenação de ontem corresponde que nem uma luva a esse pedido.
No final da ronda de reuniões, Paulo Portas entusiasmou-se e declarou que “não falar com as instituições a quem estamos a pedir dinheiro não é uma posição construtiva”. Nesta pequena e singela frase condensou todo um programa político.
Afinal, para quem Portas, Passos e Sócrates pedem dinheiro? O próprio director do Fundo Monetário Internacional já veio dizer que o problema de Portugal não é tanto a dívida pública mas sim o financiamento dos bancos e a dívida privada. Entretanto, o Ministro das Finanças esclareceu que, no âmbito do programa FMI, o Estado estará disponível para nacionalizar parcialmente bancos necessitados de dinheiro. Não há dúvidas, o empréstimo vem resolver os problemas de liquidez da banca, que brincou e lucrou com juros especulativos sobre a dívida soberana do país até ordenar ao governo que chamasse o FMI.
Mas também da dívida pública se fazem as dificuldades. E aqui, de facto, Portas pode-se gabar de ter tido uma posição construtiva. Só a factura dos dois submarinos ultrapassa os mil milhões e como se não bastasse aceitou pagar 30 milhões a mais, tipo gorjeta! Mas neste campeonato, PS e PSD também apresentam os seus trunfos. Cinco mil milhões na nacionalização do BPN, 48 mil milhões de despesa acumulada com as parcerias público-privadas. No seu conceito de justiça fiscal, a banca paga 4% de IRC e uma mercearia de bairro 25%. Sabemos bem o que significa quando nos falam dos três partidos ?responsáveis?: são as suas escolhas políticas e os devaneios da elite financeira que estamos a pagar.
É natural que a troika que nos tem governado reúna com a troika monetária: é ela que está a redigir o seu programa eleitoral. Não é negociação, é o ensaio da coreografia para assinar o empréstimo do gamanço. A acontecer, recebemos 80 mil milhões de euros mas não vemos a cor do dinheiro. Ao invés ficamos com um país mais pobre, mais desigual e mais injusto. Esta é uma “ajuda” que empurra o país para a recessão e o desemprego, que corta as pensões e os apoios sociais, que aumenta o IVA, o preço da habitação e dos medicamentos, que privatiza e nos faz pagar mais pelos serviços públicos. Em suma, coloca quem depende do trabalho a pagar a crise em proveito de quem a provocou e sempre com ela lucrou: o capital financeiro.
A troika PS/PSD/CDS candidata-se ao cargo de regente do FMI. A esquerda candidata-se para um governo democrático que sirva os interesses da população. A esquerda rejeita esta “ajuda” de maçã envenenada. Não negoceia as condições daquilo que rejeita, apresenta alternativas. Não baila ao sabor das suas trovas, pede uma auditoria à dívida pública e privada para saber o que nos querem meter a pagar e a quem. Não escolhe entre o gamançozinho e o gamançozão, responsabiliza e pede contas a quem de direito.
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