A nova prioridade de Durão Barroso
De acordo com a imprensa francesa, o Presidente da Comissão Europeia, Durão Barroso, quer muito rapidamente concretizar um desígnio antigo: reforçar o cultivo de organismos geneticamente modificados (OGM) na União Europeia.
No primeiro mandado do antigo primeiro-ministro português, este objectivo foi refreado pelo então Comissário para o Ambiente, o grego Stavros Dimas, que se opunha a estes cultivos. Agora, com a saída de Dimas a tarefa parece facilitada.
A renovação da autorização do milho MON810 da Monsanto, o único OGM actualmente cultivado na União, e a introdução do cultivo da batata Amflora da BASF são as prioridades apontadas por Durão Barroso.
O impacto dos OGM's na saúde humana e animal a longo prazo são ainda bastante desconhecidos, pelo que deveria imperar o princípio da precaução. Contudo, é sabido que alguns destes organismos poderão causar problemas alérgicos e acumular toxinas acima dos níveis normais.
Em termos ambientais, o impacto dos OGM's é por demais evidente, com a ameaça à biodiversidade, a contaminação genética de outras variedades e a possível redução da produtividade agrícola destas. Para mais, o raio de acção destes efeitos não se constrange à zona de cultivo de OGM's, o que não só dilata o seu impacto como atenta contra os direitos dos cidadãos que optam por manter e declarar as suas zonas livres de transgénicos.
A contínua opção pela uniformização genética das sementes pode ainda, numa situação ecológica ou climática diversa, reduzir drasticamente as colheitas com consequências sociais e de segurança alimentar graves.
A decisão tem ainda implicações económicas profundas. A autorização do cultivo permite ganhos extraordinários devido às patentes das sementes (a BASF, por exemplo, conta arrecadar 30 a 40 milhões de euros pela sua batata). Porém, a panaceia da produtividade imediata deixa a Europa e os seus povos reféns dos custos e das restrições destes direitos de propriedade. A monopolização da produção alimentar estende-se ainda às áreas associadas, nomeadamente a fertilizantes, pesticidas e outras produtos químicos que passam a ser adaptados à especificidade genética da variedade em causa, sendo também patenteados.
Um dos argumentos mais utilizados em defesa deste tipo de cultivo é a sua contribuição no combate à fome no mundo. Porém se o ganho de produtividade é já de si questionável, não será certamente o pagamento de dividendos que combate o problema, mas sim a redefinição de prioridades produtivas e do acesso à produção bem como, num sentido mais lato, a redistribuição da riqueza.
A pressão das grandes multinacionais do sector, como a Monsanto, sobre os grandes produtores e consumidores alimentares tem-se intensificado. Ainda este mês a Índia, o maior produtor mundial de beringelas com 4 mil variedades diferentes, rejeitou a introdução de uma beringela geneticamente modificada (a BT brinjal) depois de intensos protestos populares.
Também na Europa, a opinião pública e a sua influência são o grande obstáculo à introdução de OGM's. Seis estados-membros, onde se incluem Alemanha e França, não permitem o cultivo do MON810, e onze estados-membros solicitaram a interdição de todos os cultivos geneticamente modificadas. Se não podemos contar com Durão Barroso para a tarefa, contamos com os cidadãos e a sua força para proteger o interesse social na produção alimentar.
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