[publicado no Diário de Aveiro, 27 de Abril de 2007]
1. Recentemente, o Governo lançou uma campanha publicitária para divulgar o seu programa Novas Oportunidades. Na campanha podemos ver personalidades públicas “bem sucedidas”, numa realidade alternativa onde não estudaram e, como tal, desempenham profissões “menos meritórias”, seja lá o que esta classificação subjectiva das actividades profissionais for.
Embora seja meritório um programa de incentivo à continuação dos estudos, entendo que nesta campanha publicitária existem tremendas confusões. Antes de mais, vende a ideia de que a conclusão dos estudos permite automaticamente emprego qualificado. Basta ver o número de trabalhadores qualificados que exercem a sua actividade fora da sua área de formação e de forma precária, como em centros comerciais ou alugando-a a empresas de trabalho temporário. A campanha esquece ainda o número de estudantes universitários que trabalham nessas mesmas profissões para pagar a sua formação. Não reconheço portanto nestes anúncios o meu país, sendo que ao esconder e negar esta realidade apenas funciona como propaganda ao Governo, branqueando as políticas que sucessivamente levaram à situação que enunciei.
Em segundo lugar, a campanha valoriza mais o estatuto social do grau de ensino do que os conteúdos obtidos nesse percurso, já que existem várias formas de adquirir conhecimento.
Em terceiro, a campanha publicitária transparece o modelo de ensino que o Governo perfilha. Progressivamente a formação e o ensino público, em todos os seus níveis, é dirigido para preparar e adequar o cidadão a mão-de-obra para responder às necessidades das empresas empregadoras, de forma a aumentar a sua produtividade e lucro. Se compreendo que se deva responder a esta necessidade, em caso algum o ensino público se deve cingir a esta componente. A escola e a universidade são locais de excelência para a formação – não se leia formatação – do cidadão. A escola não serve apenas para atribuir competências, mas também conteúdos e fomentar a consciência critica, a discussão e a cidadania.
Por último, para demonstrar que a campanha não tem qualquer ligação à realidade bastaria que trocassem os actores. Em vez de convidarem Judite de Sousa, porque não realizar o anúncio com alguém que não tenha prosseguido os estudos como José Saramago, tão só Prémio Nobel da Literatura?
2. O Ministério do Ensino Superior decidiu encerrar a Universidade Independente por esta não reunir as condições mínimas necessárias para o seu funcionamento. Nas fiscalizações periódicas a que Independente – e todas as outras universidades – são sujeitas nada lhe foi apontado, tinha portanto todas as qualidades e condições para manter a actividade. Portanto que se pode pensar agora? Que de facto durante todo este tempo a Independente foi um estabelecimento de ensino de qualidade e que agora, de um momento para o outro, se deteriorou de tal forma que o seu encerramento é a única solução!
Esta semana foi a vez de conhecermos as tropelias na Universidade Autónoma.
Contudo, mesmo que o encerramento da Independente seja irreversível, terá uma segunda oportunidade? É que na imprensa já correm informações que alguns dos sócios da Independente se preparam para abrir uma universidade com outro nome (Pedro Alves Cabral), nas mesmas instalações da Independente e com o actual corpo docente.
Por quanto tempo mais teremos que ouvir a ladainha de que a gestão privada é mais eficaz e de maior qualidade que a pública? Quando alguém se lembrar de privatizar o ensino superior em Portugal?
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